quinta-feira, 5 de abril de 2012

A triste verdade em letras garrafais

Pare o que você está fazendo. Vá até o banheiro e coloque-se diante do espelho. Agora, olhe atentamente para seu rosto. Preste bastante atenção à sua testa. Talvez você não tenha percebido, mas está escrito OTÁRIO – assim, em letras garrafais, ou caps lock, como você preferir.

Sim, meu amigo, somos um bando de otários. Pelo menos eu e você, que não somos agraciados com as tão desejadas pulseirinhas coloridas que separam os “very importants” da ralé (nós). Roger Waters acabou de passar pelo Brasil com sua turnê “The Wall”. O show é sensacional. Começa com uma projeção da palavra “capitalismo” em letras que lembram a logomarca da Coca-Cola, faz uma homenagem ao brasileiro Jean Charles de Menezes – assassinado por engano no metrô de Londres em 2005 ao ser confundido pela Polícia com um terrorista – e tem até participação de crianças carentes.

O que o ex-Pink Floyd provavelmente não sabe é que, para assisti-lo ao vivo, temos de passar por uma série de abusos. Abusos que se repetem a cada vez que uma multidão se reúne em torno de algum espetáculo.
divulgação

Quem foi ao show de Roger Waters em São Paulo no começo da semana teve de desembolsar até R$ 150,00 (isso mesmo, cento e cinquenta reais, não é um erro de digitação) nas mãos de um flanelinha para estacionar o carro na rua. Na saída, muitos encontraram seus carros depredados e furtados. Para completar a ‘noite de sonhos’, um arrastão esperava por quem estava indo embora. É uma nova modalidade que tem tudo para pegar no Brasil: o assalto triplo. Na mesma noite, o sujeito é extorquido, furtado e roubado.

Isso no dia do show, porque o assalto começa muito antes. O Brasil tem um dos ingressos mais caros que se tem notícia. Também fomos os criadores da incompreensível “pista vip”, um jeitinho que os organizadores arrumaram para arrancar mais dinheiro de quem está ali porque ama o artista, e não para aparecer em coluna social.

Não satisfeitos, inventaram uma ‘taxa de conveniência’ – que fica entre 15% e 20% do valor da entrada – para você retirar o ingresso na bilheteria. Conveniência de quem? Minha e sua, com certeza, não é.

O Brasil entrou com força no circuito dos shows internacionais. Paul McCartney anda tocando por aqui mais que o Roupa Nova. E pode ter certeza que não é porque descobriu que ama os fãs brasileiros, mas porque o dinheiro está entrando, enquanto em boa parte do mundo a crise anda brava.

Quem me conhece sabe que é mais fácil eu falar mal da minha mãe que de um beatle, mas não dá mais para ser ingênuo e romântico.

A esperança é de que, com o aumento da oferta de shows, o público comece a selecionar mais, a procura caia, e os organizadores se vejam forçados a pegar um pouco mais leve no estupro. Porque, sinceramente, cansei de ser VIP – Very Idiotic Person.

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