No começo
de abril, troquei o Rio de Janeiro por Belo Horizonte. Depois de seis anos na
capital fluminense, decidi voltar para trilhar um novo caminho na minha vida,
tanto profissional como pessoal. Dois meses depois, Ronaldinho fez a mesma
viagem, talvez com os mesmos objetivos que eu.
Quando
surgiram as primeiras notícias sobre as negociações do Dentuço com o Atlético, fui
contra a contratação. Ronaldinho teve a chance de reescrever sua história no
futebol quando voltou para o Brasil. Poderia pagar uma “dívida” com o Grêmio, o
clube que o revelou e para o qual ele torce até hoje, por mais que isso pareça irreal.
Mas ele
sabia que em Porto Alegre teria de mostrar serviço, reconquistar uma torcida
que o tem atravessado na garganta. Teria de ralar em campo e fora dele, mostrar
um comprometimento além do cobrado de um atleta profissional comum. Seria como
um namoro reatado após uma traição de um dos lados. Escolheu o caminho mais
fácil e atraente. Foi para o Rio, cidade que não dorme, onde os pagodes
acontecem de segunda a segunda, até amanhecer.
O maior
pecado de Ronaldinho foi acreditar que bastava ser boleiro para ter sucesso no
futebol brasileiro. Mas esse tempo já passou. O Brasil tem bons jogadores,
gente que não quer mais se aventurar fora dos grandes centros europeus. Junto a
isso, existe o fato de o cara não receber. Por mais que você não precise de
dinheiro, ninguém gosta de trabalhar de graça, e ele não pode ser condenado por
isso.
Quando o
negócio se tornou iminente, apareceram muitos jornalistas querendo ser o “pai
da notícia”, cravando sem nenhuma fonte que tudo estava acertado para depois
tentar se vangloriar de ter noticiado primeiro. Uma lástima. A verdade é que a contratação
de Ronaldinho pegou todo mundo de surpresa, mas não deveria. Para onde poderia
ir o Dentuço?
Ronaldinho
dificilmente iria para outro clube do Rio. A mesma torcida do Flamengo que o
colocou como deus iria persegui-lo pela cidade. No Sul, as chances também eram
remotas. As portas estão fechadas no Grêmio, e por mais que fosse um belo tapa
de luvas do Inter em seu maior rival, não há espaço para ele hoje no time.
Também não
vejo o Dentuço jogando por um clube de São Paulo, onde a pressão é enorme, e
quando as coisas não estão bem, a torcida costuma invadir treino e até quebrar
carro de jogador. Restava a ele então Belo Horizonte, ou algum clube menor no
Nordeste ou de sua amada Santa Catarina.
Ronaldinho
se considera grande demais para jogar pelo Bahia, Figueirense, ou se aventurar
numa Ucrânia da vida. Portanto, ou era Galo e Cruzeiro, ou o futebol chinês. Ele
teria mercado na China, e receberia um caminhão de dinheiro, mas abriria mão de
disputar a Copa do Mundo, um sonho que ele realmente tem.
O cenário
que se desenhou mostrava Beagá como o paraíso para Ronaldinho. Um clube grande,
sem a pressão que ele encontraria em outros lugares, e com uma torcida que vai
apoiá-lo muito antes de começar a pegar em seu pé. Muita gente criticou, muita
gente ficou no lugar comum, afirmando que “só o tempo dirá” se foi um acerto do
Atlético. Óbvio.
Pelo
histórico, eu não apostaria em Ronaldinho. Se ele não quis mostrar serviço no
Flamengo, por que faria isso pelo Galo? Mas entendo a diretoria do Atlético em
apostar no Dentuço. Não acredito que ele vá ganhar “apenas” R$ 300 mil por mês,
mas também aposto que não receberá o salário que supostamente receberia no Fla.
Ronaldinho
é uma contratação pontual do Atlético. O time precisa de um jogador exatamente
com as características dele. Alguns criticaram a contratação dizendo que vai
atrapalhar o jovem Bernard, mas discordo. Não se pode colocar nas costas de um
garoto de 19 anos a responsabilidade de armar as jogadas de um dos maiores
clubes do país.
Se Cuca
souber trabalhar e Ronaldinho tiver um mínimo de boa vontade, Bernard terá uma
ótima oportunidade de aprender, de se tornar um jogador melhor, e poderá
amadurecer sem a cobrança que teria esse ano.
Toda
contratação é uma aposta, não importa o nome. Grandes jogadores não vingaram em
grandes equipes. Foi assim com Shevchenko no Chelsea, Kaká no Real Madrid, e a
lista continuará crescendo. Comparando a uma rodada de poker, Ronaldinho já foi
um Royal Flush. Não é mais e nem será. Mas ainda é uma Trinca. Não é a melhor
mão, mas é o suficiente para garantir importantes vitórias, especialmente pra
quem está acostumado a apostar todas as suas fichas com um par de dois nas mãos.